sexta-feira, 3 de julho de 2020

Política de Saneamento no Brasil: Privatização é a Solução?





Professor João Correia*

 

A questão do saneamento básico, uma dívida histórica dos governantes brasileiros com à população, renasce no cenário da Covid-19 sem que a população tenha o direito de participar do debate sobre esta política vital para o desenvolvimento social.

A falta de investimento no saneamento é evidenciado ao se constatar  que, de acordo com estudo do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento, 35 milhões de brasileiros, vivem sem acesso a água potável e, em apenas 46% das residências o esgoto é tratado. 

A falta de debate público aprofundado e o equivocado direcionamento das Leis, no que diz respeito a aplicação e gestão dos serviços, levam ao descrédito, na percepção da população, as políticas e leis elaboradas no Congresso Nacional.

Se os nossos gestores públicos brasileiros tivessem uma postura realmente ética, não teríamos que discutir o repasse das suas responsabilidades para o setor privado.

A falta de compromisso do gestor publico emperra a aplicação da política de saneamento básica no Brasil, tanto que, no período compreendido entre os anos de 2003 e 2013, o estado brasileiro contou com recursos  abundantes devido a elevação mundial do preço das commodities (minérios de ferro e petróleo), contexto no qual foram disponibilizados recursos para o saneamento através de Programas da FUNASA e do Ministério das Cidades.

Mesmo assim, e com as atuais linhas de crédito para implantação da política de saneamento, a execução desta politica não ocorre devido à incompetência técnica das gestões estaduais e municipais e, principalmente, a falta de vontade política para enfrentar os obstáculos que existem para viabilizar a implantação de políticas que minimizem os problemas do saneamento básico no Brasil.

O que não podemos aceitar, é a implantação de uma política de saneamento básico já reprovada em vários países do mundo, como solução para sanar um problema secular existente no Brasil, jogando a responsabilidade que é do poder publico, para o setor privado, sem consultar a população que será atingida pelo processo de privatização.

Pesquisas da Organização das Nações Unidas, deixam claro que, em regra, a privatização dos serviços de saneamento básico representou um encaminhamento para a falta de transparência na prestação do serviço, tarifas elevadas, corrupção e descumprimento de prazos dos contratos em mais de 180 casos, executados em 35 países.

A reestatização vem ocorrendo em vários países desenvolvidos, como nos casos da França e Alemanha, em países em desenvolvimento, como por exemplo, na Hungria e Argentina, e em países subdesenvolvidos, a exemplo de Moçambique e Bangladesh.

Entre tantos insucessos, destacamos os casos positivos de privatização dos serviços de saneamento efetuados na Inglaterra e no País de Gales, mas considerando a diferença de estrutura, financiamento, tamanho territorial e cultura do povo em relação ao modelo brasileiro.

O Projeto de Lei nº 3.261/2019, de autoria do Senador Tasso Jereissati (PSDB/CE), que define o novo marco regulatório do saneamento no Brasil, propõem ilusões e transformações com capital privado no valor de mais de R$ 537 bilhões de reais em 20 anos, e esse investimento está baseado na parceria público privado, que nada mais é do que a entrega do patrimônio público às empresas privados com segurança jurídica, ou seja, o estado brasileiro será o maior segurador financeiro da empresa privada.

É mínima a diferença entre este projeto e os modelos de privatizações implantados no Brasil, como em Manaus e Tocantins que não deram certo, patenteando que nada justifica a imposição da pretensa eficiência privatista em detrimento da prestação pública. Os exemplos observados nos mostram que o Brasil está trilhando um caminho errado, pois só vislumbra o interesse do grande capital de lucrar nas costas do povo.

Esse Marco Regulatório, vem ao encontro dos anseios de uma minoria, uma minoria poderosa economicamente e organizada políticamente, formada por grandes empresas ligadas à construção civil e multinacionais de saneamento, que têm exercido grande influência sobre diversos setores do governo.

A veracidade das informações descritas é atestada pelo fato de que associações prestigiadas ligadas ao saneamento, entre estas, a  ABES (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental), ABAR (Associação Brasileira de Agências de Regulação), ASSEMAE (Associação Nacional dos Serviços de Saneamento Municipais) e AESBE (Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais), se posicionam de forma contrária às medidas provisórias propostas no Projeto de Lei nº 3.261/2019.

O abastecimento de água é um direito humano, previsto pela ONU devido a sua essencialidade à vida. Assim, constatamos que os segmentos menos favorecidos da população brasileira, principalmente os que moram nas pequenas e médias cidades e nas periferias das metrópoles, continuarão sofrendo com a ineficiência dos serviços de saneamento, pois não são lucrativos para os grande empresários, e, mais uma vez o meio ambiente será transformado em mercadoria pelo governo brasileiro para satisfazer o mercado internacional.

 

*Especialista em Meio Ambiente e Mestrando em Educação Global.

 

 


Um comentário:

Unknown disse...

Muito bom o texto....