POR UMA VISÃO CIENTÍFICA DA GESTÃO UNIVERSITÁRIA
Prof. Roberto Leal Lobo e Silva Filho
Com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, a pesquisa científica passou a ser uma exigência para todas as universidades brasileiras. No embalo, as comissões de especialistas passaram a valorizá-la na avaliação dos cursos de graduação, mesmo os que estavam em instituições não-universitárias. Para atender às exigências da legislação e do MEC, foram criadas, em muitas IES, pró-reitorias, diretorias ou comissões de pesquisa, isoladas ou combinadas com outras atividades como extensão ou pós-graduação. Esses novos órgãos surgiram, quase sempre, artificialmente, não para regulamentar ou apoiar uma pesquisa já existente, mas para, de cima para baixo e burocraticamente, criar uma instância de pesquisa nos gabinetes dos administradores universitários, que passaram a usar e abusar do uso do termo, sem qualquer base concreta. Infelizmente, o fato de falarem tanto em "pesquisa" não os fez compreender os princípios, métodos e méritos da pesquisa e de uma visão científica da realidade em suas próprias atividades de gestores da educação superior. Mesmo onde a pesquisa é uma atividade regular da Instituição, os procedimentos que dela advêm não foram incorporados à rotina ou à postura da administração universitária. A humildade de reconhecer que sempre é tempo de aprender, o realismo de aceitar os resultados, procurar entendê-los e não descartá-los quando não são favoráveis, o desejo de melhorar sempre - a partir do reconhecimento de problemas identificados - e de acreditar nos dados e nas metodologias que escancaram a realidade, aproveitando exemplos bem sucedidos, nacional e internacionalmente, continuam não fazendo parte do cotidiano da maioria dos nossos dirigentes universitários, apesar de serem estes os pilares da postura científica. Se o estudante reclama do atendimento é porque está revoltado com o valor das mensalidades, nunca porque o atendimento é realmente deficiente; se avalia mal um professor é porque o aluno é "um rancoroso que só gosta de professores que dão dez e fazem churrasco com ele", se a nota no ENC despenca cada vez mais é porque "o aluno sabota o exame porque não gosta de pagar mensalidades ou não tem compromisso com os resultados" (por que os das outras IES têm?), se os gestores estão desperdiçando recursos por causa do mau acompanhamento gerencial é porque "alguém" quer fazer veneno contra o diretor da área, se a pesquisa é identificada como de má qualidade, tanto quanto a famosa revista científica intra-muros, é porque "querem que todos sejam iguais à USP". Enquanto isso, nossos gestores universitários estarão aconchegados em seus gabinetes, decidindo baseados em impressões não-comprovadas, na opinião de meia dúzia de colaboradores, ou no infalível feeling, gerindo a distância a "excelente" pesquisa implantada recentemente, ou o ensino de "qualidade" oferecido pela instituição aos alunos "mal agradecidos e vadios". É fundamental que os órgãos de política educacional não incorram, também, nesses mesmos erros. Um exemplo é o tratamento não-científico dado, muitas vezes, à própria pesquisa científica. Para implantar a pesquisa institucionalizada, exigência legal, nosso gestores quase nunca procuram conhecer a área, ou aprender com bons exemplos nacionais e internacionais.Muitos acham que é só contratar professores em regime de tempo integral - mesmo que eles não tenham projeto que justifique este regime, nem formação ou experiência para isso, nem mesmo lugar para sentar, estante para colocar seus livros (quanto mais recursos específicos para pesquisa) - criar meia dúzia de bolsas de iniciação científica, sem qualquer orientação destes estudantes por parte de pesquisadores experientes, uma vez que "o aluno deve encontrar seu próprio tema de pesquisa e desenvolvê-lo autonomamente, para valorizar a pesquisa na graduação" (só no Brasil se ouve este absurdo) e criar uma revista científica "local", em que artigos das mais diferentes áreas são misturados numa salada científica, geralmente de mau gosto e péssima qualidade, aceitos por um comitê editorial local de comprovada endogenia. Enquanto nossos gestores não conseguirem ver o rei nu, será sempre necessário que apareça o menino da história para denunciar a farsa, mas aí a culpa será sempre do menino... e o rei, continuando nu, piorará do resfriado e acabará pegando uma pneumonia no inverno. Até quando o espírito científico vai ser enxotado de tantos gabinetes da alta administração universitária? Infelizmente, a falta da incorporação de uma visão mais científica na gestão de órgãos públicos e privados, como a análise de dados e da opinião dos usuários, a utilização dos exemplos bem sucedidos, enfim, a vontade de conhecer a realidade sem disfarces para poder transformá-la, ainda faz com que nosso País volte sempre à estaca zero, num eterno recomeçar.